Déficit de Pessoal da Funai é Alarmante

Funai atua com 30% da sua força de trabalho e Ministério do Planejamento tem até dia 31 de agosto para garantir a inclusão orçamentária do adicional de 50% de candidatos aprovados e não convocados no último concurso da Funai.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) é a autarquia da União responsável pela coordenação da Política Indigenista no Brasil. Contava, em novembro de 2017, com quase 2.300 servidores em exercício, distribuídos em mais de 180 municípios, em 26 unidades da Federação. A instituição é responsável pelo monitoramento e a proteção de quase 600 terras indígenas, que abrangem uma área de mais de 117 milhões de hectares e cerca de 13% do território nacional. Atende a uma população indígena de quase 900 mil pessoas, agrupadas em mais de 300 etnias e falantes de mais de 270 línguas diferentes.

Em fevereiro de 2009, a Presidência da República sancionou a Lei nº. 11.907, que criou 3.100 vagas para o quadro de pessoal da Funai, divididas entre Indigenistas Especializados, Agentes em Indigenismo e Auxiliares em Indigenismo. Do total de vagas criadas, cerca de 420 tiveram o provimento autorizado por parte do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG, hoje MPDG), o que ocorreu por meio do concurso público de 2010 e, posteriormente, mais 220 vagas foram ocupadas por meio do concurso realizado em 2016. Essas nomeações estão longe de atender a necessidade da força de trabalho do órgão, que ficou sem concurso público por décadas. Em janeiro de 2018, foram empossados 184 dos 202 indigenistas especializados nomeados na data de 28 de dezembro de 2017. Em segunda chamada, foram convocados mais 39 aprovados, de forma a serem ocupadas as vagas que permaneceram sem provimento.

Apesar desse provimento, a Funai ainda passa por um grande déficit de servidores.

Segundo dados da Funai, a autarquia possui 5.584 cargos aprovados pelo MPDG e somente 2.078 cargos ocupados (esse número decresce a cada dia, pois mensalmente diversos servidores se aposentam). Isso significa que a força de trabalho da autarquia é de apenas 30%, sendo que 60% deles estão aptos a se aposentar até 2.020.

Helton Santos (2018)1 , em estudo sobre a distribuição da força de trabalho no órgão, constatou que houve redução da ordem de quase 10% da força de trabalho da Funai entre 1º de janeiro e 06 de novembro de 2017. Nesse período, ocorreram 151 aposentadorias e a perda de 80 cargos comissionados. Do total de servidores, 567 (mais de 25% do quadro) já haviam cumprido o requisito para a aposentadoria e optaram por permanecer trabalhando. Outro número alarmante é a estimativa de 730 aposentadorias nos próximos 10 anos, considerando que entre os cerca de 2.300 servidores que estavam na ativa em 2017, 60% tem mais de 50 anos de idade e em pouco tempo cumprirão os requisitos para a aposentadoria.

Segundo o Acórdão 2.626-2015 – Análise Sistêmica da Funai, de 2015, o então deficiente quadro de pessoal da Funai revelava:

“(…) os efeitos da baixa frequência de realização de concursos públicos num período de trinta anos, especialmente durante a década de noventa até 2004. O envelhecimento do quadro implica redução significativa da capacidade operacional da Funai, indicando o curso de um processo de enfraquecimento institucional… A carência quantitativa e qualitativa de pessoal é um problema crônico na Fundação e, há muito, vem sendo encarado internamente como a principal fraqueza da instituição. Cumpre destacar que a própria Funai já reconhecia em 2004 que o problema principal da Fundação consiste na ausência de reposição de mão‐de‐obra para assistir os povos indígenas (trecho do relatório de auditoria operacional TC 011.202/2002, que tratou de avaliar o desempenho da entidade na implementação do Programa de Etnodesenvolvimento)”.

Como Medida Mitigadora, o TCU constatou “que o Ministério do Planejamento autorizou a realização de um concurso público para 220 vagas para o cargo de Indigenista Especializado (cargo de nível superior) para a Funai, concurso que deverá ser realizado até o primeiro semestre/2016”. Mencionou‐se também a criação dos 3.100 cargos no Quadro de Pessoal da Funai pela Lei 11.907/2009, integrante do Plano Geral de Cargos do Poder Executivo (PGPE).

O TCU termina por avaliar que:

“Entre os riscos analisados, merece destaque o de maior relevância interna, qual seja, o enfraquecimento crônico da força de trabalho, o qual se mostrou como um evento com elevada probabilidade de ocorrência, vez que a baixa frequência na reposição de pessoal é um processo de longa data, que só recentemente deu sinais de reversão, dada a realização de um concurso em 2010 e outro em andamento”.

WhatsApp Image 2018-08-15 at 11.57.48Da mesma forma, o relatório do Levantamento de Governança e Gestão de Pessoas do TCU, realizado em 2016, apontou como inexistente, dentro da Funai, os seguintes quesitos: Planejamento da Força de Trabalho, Planejamento da Gestão de Pessoas e Retenção de Talentos. Diante disto, é imperiosa a necessidade da recomposição e correta alocação da sua força de trabalho, para que seja recuperada a capacidade de execução das políticas sob responsabilidade do órgão.

O reduzido quadro de servidores, como demonstrado nos documentos citados acima, vem comprometendo a promoção e proteção dos direitos indígenas no Brasil. É dever do Estado alocar recursos humanos suficientes ao desempenho de suas finalidades constitucionais. O estrangulamento do quadro de servidores da Funai significa, na prática, a precarização do atendimento a quase 1 milhão de indígenas, nas mais variadas áreas de atuação da entidade, desde a emissão de documentos até a demarcação territorial.

É imprescindível que sejam observados os preceitos constitucionais de 1988 no que concerne aos Povos Indígenas. O art. 37 da Constituição da República estatuiu o princípio da eficiência, vedando ao Estado organizar-se de forma precária.

O artigo 11 do Decreto n° 6944/2009 determina que “durante o período de validade do concurso público, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão poderá autorizar, mediante motivação expressa, a nomeação de candidatos aprovados e não convocados, podendo ultrapassar em até cinquenta por cento o quantitativo original de vagas”.

A INA – Indigenistas Associados acredita que as informações contidas nos Relatórios do TCU de 2015 e 2016 são, por si, motivação expressa da necessidade de convocação dos 50% de vagas previstas no Decreto.

A Funai instaurou o processo administrativo 08620.005695/2018-68, solicitando a autorização para convocação de todos os aprovados no concurso, inclusive dos 50% a mais do número original de vagas. O processo com a demanda do adicional de 50% foi encaminhado ao Ministério da Justiça em 29/06/2018, e após análises e ajustes por parte da Funai e do MJ, seguiu para o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MPDG), em 25/07/2018, por meio do Aviso nº 257/2018-MJ. O processo foi iniciado no MPDG sob o protocolo nº 03154.008222/2018-42.

Atualmente, encontra-se na Coordenação Geral de Concurso e Provimento de Pessoal – CGCOP/DEPRO, da Secretaria de Gestão de Pessoas do MPDG. O prazo para a inclusão da demanda do adicional de 50 % dos aprovados na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2019 é dia 31 de agosto de 2018. Esse ainda é o primeiro setor pelo qual o processo precisa passar, em um total de quatro setores antes de chegar ao Gabinete do Ministro para assinatura.

A despesa referente a essa nomeação não foi incluída da Lei Orçamentária do ano de 2018. Por outro lado, o Anexo V da Lei Orçamentária do exercício corrente com um total de 2779 cargos vagos, que segundo informações do próprio site do Planejamento: “O Anexo V não especifica os órgãos e entidade do Poder Executivo federal que serão contemplados, mas abrange uma projeção de cargos e orçamentos globais, que são alocados conforme as prioridades do governo (respeitando os limites pela própria Lei).” e ”O orçamento para o preenchimento de cargos vagos, no âmbito do Poder Executivo, não é previsto de forma discriminada, de modo que prevaleça a discricionariedade da Administração Pública Federal para, durante o exercício financeiro correspondente, realizar ajustes na execução orçamentária conforme sobrevenham necessidades imperiosas não previstas ou mudem as prioridades estabelecidas no ano anterior.”.

Nesse sentido, a INA oficiou o Presidente da Funai, o Ministro do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e o Ministro-Chefe da Casa Civil solicitando apoio para garantir a inclusão da nomeação do adicional de 50% de candidatos aprovados e não convocados no último concurso na LOA, cujo prazo é 31 de agosto de 2018.

A 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Mistério Público Federal – MPF tem apoiado a causa a fim de que o MPDG autorize esse pedido. O mesmo também ajuizou processo de Ação Civil Pública solicitando o chamamento dos aprovados excedentes e a realização de um novo concurso público.

A própria Funai já reconheceu tecnicamente, no processo enviado ao MJ e que agora se encontra no MPDG, a gravidade do problema gerado pelo enfraquecimento da força de trabalho e encaminhou a justificativa para o chamamento dos 50% excedentes.

Nesta sexta-feira, 17 de agosto de 2018, um grupo de servidores da Funai irá ao MPDG para ter informações sobre o andamento do processo. No período da tarde, está agendada uma reunião do presidente da Funai com um grupo de representantes dos aprovados no concurso para discutir este assunto.

Diante da gravidade da situação do quadro de pessoal da instituição e da importante missão constitucional que exerce, acreditamos que esta demanda seja legitima, necessária e atenda os requisitos legais. Solicitamos apoio para dar visibilidade nesta questão.

1 SANTOS, H. S. Análise da distribuição da força de trabalho da Fundação Nacional do Índio. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Gestão Pública) – Escola Nacional de Administração Pública, Brasília.

Indigenistas Associados

15 de agosto de 2018

 

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